Notícia via Agência de Notícias da Aids
No Recife (PE) não se fala em luta contra aids sem que o nome de Alessandra Nilo esteja à frente. Ela é uma das fundadoras da ONG Gestos, Soropositividade, Comunicação e Gênero, que surgiu em 1993 e se transformou numa das maiores frentes de combate à epidemia no país. A Gestos tem também atuação internacional. Como coordenadora de políticas estratégicas, Alessandra viaja pelo menos uma vez por mês ao exterior -- desde 2001, ela representa a sociedade civil brasileira na Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre Aids, em Nova York.
Jornalista e cineasta, Alessandra também faz parte da diretoria da Abong (Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais), integra o Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030, é secretária regional da Laccaso (Conselho Latino Americano e Caribenho de ONGs/Aids), coordena no Brasil a campanha Mulheres Não Esperam Mais, que faz a conjução entre a epidemia do HIV e a violência contra as mulheres. Incansável, ainda dirige filmes – em 2015, seu curta-metragem “Urbanos” ganhou vários prêmios em festivais no Brasil, em Portugal e em Bogotá.
“Para dar conta de tudo, trabalho pelo menos nove horas todo dia”, conta a recifense de 48 anos, mãe de duas filhas: Maria (23 anos), do primeiro casamento, e Clara (15), do segundo, que dura 17 anos.
Tradição política
Alessandra conta que o ativismo está no sangue. “Minha família tem uma tradição de militância política. Eu comecei a militar no movimento estudantil.” Mas ao se interessar por HIV/aids não imaginava que um dia fosse se envolver tanto com o assunto.
“Foi no fim dos anos 80, comecinho de 90. Um amigo foi infectado e ninguém sabia nada sobre a doença. Ele estava definhando, as pessoas não podiam visitá-lo, pois a família praticamente o isolou. Acabaram saindo do país com ele. Esse amigo morreu e eu estava muito impotente diante daquilo tudo. Resolvi estudar, entender, encontrei outras pessoas com o mesmo interesse e fundamos o Fórum Aids Pernambuco. Alguns anos depois, fundamos a Gestos, já prevendo que a questão de gênero teria impacto na epidemia e a disseminação da informação, isso desde sempre, era absolutamente essencial.”
Mulher e aids sempre foi tema prioritário para a ativista, que reconhece avanços como a queda da transmissão vertical (infecção de mãe para filho durante gravidez, parto ou amamentação), graças aos novos tratamentos. Mas isso não basta, para ela. “Avanço de tecnologia não significa avanço de discussão. O olhar para a mulher não mudou. Ela continua invisível para áreas como a prevenção, os direitos sexuais e reprodutivos. Consideram que, epidemiologicamente, não justifica investir nela, pois não é uma população importante.”
Números indicam que não é assim. Embora haja mais homens infectados do que mulheres, que seguem numa tendência de queda nos últimos dez anos, há dados preocupantes. Por exemplo, na faixa etária entre 13 e 19 há mais casos de HIV/aids entre mulheres do que entre homens.
“As mulheres têm maior vulnerabilidade por causa da sua condição mesmo. E não há nada de política de prevenção para ela. Não existe uma pesquisa que leve em conta a constituição física da mulher para medicá-la. A gente não consegue nem discutir a camisinha feminina, porque ela só é distribuída para as profissionais do sexo. As mulheres trans, então, ficam ainda mais à margem.”
Atualmente, a relação aids/violência no universo das mulheres vivendo com HIV tem merecido atenção especial de Alessandra. “A violência física e psicológica já é presente na vida delas. Depois do diagnóstico, isso aumenta. É grande o número de mulheres que pegam o vírus dos maridos mas são acusadas de terem passado para eles. Sem contar que elas deixam de cuidar delas para cuidar dos companheiros, dos filhos. Geralmente, cuidam de muita gente e não têm ninguém cuidando delas.”
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